Conto de Goiki III – Capítulo 8 – Encontro com o Espectador
Narrado pelo escriba Goiki III (Bárbaro Draconato seguidor de Bahamut – Jogador Francisco Weslley – estudante do 2º ano do ensino médio do colégio Monsenhor Constantino Vieira)
Aventura do dia 24 de maio de 2017 no projeto RPG na escola, coordenado pelo prof. Helltonn Winicius
Retornamos ao vilarejo e entramos em um velho templo local que o falso clérigo de Moradim utilizava como covil. Tentando investigar o interior do templo, encontramos uma passagem secreta que levava a uma extensa escadaria subterrânea. Fui o primeiro a descer, meus colegas vieram logo atrás. Infelizmente não notamos uma das armadilhas ocultas nos degraus da escadaria que amaldiçoou nosso amigo Donovan, quando ele pisou no dispositivo liberou uma espécie de pó semelhante ao da múmia que enfrentamos a pouco tempo.
Todos acreditavam que não ativei a armadilha por já ter sido amaldiçoado no combate. Antes que Ryu passasse, orou a Lathander para que dissipasse aquela energia maligna, um rompante de luz varreu-a para longe, liberando o caminho de tal ameaça.
Descemos mais um pouco e vimos uma ponte feita de cordas conectando duas extremidades de um abismo. Nos aproximamos da ponte, devia ter entre 30 a 40 metros, entretanto as cordas pareciam muito desgastadas, uma lufada de vento se projetou do abismo e sentimos a podridão de cadáveres em decomposição. Isso não iria nos deter de ir! Então para saber onde o falso clérigo estava, decidimos atravessar.
Próximo a metade da ponte, escutamos um som de asas batendo vindo da escuridão abaixo, o som era forte e ecoava por todo o lugar, segundos depois, vimos um gigantesco verme alado com dentes do tamanho de um machado, sua pele azul púrpura parecia bastante resistente a golpes cortantes.
Quando o monstro se mostrou eu reagi, puxei o ar dos meus pulmões e o joguei para fora como um cone de fogo que acertou a criatura, entretanto, não pareceu causar dano considerável na criatura, porém suficiente para atrair sua atenção. Ryu, mais atrás, juntou as mãos, sussurrou preces, seu corpo foi envolto por raios, ele empunhou seu símbolo sagrado e gritou:
– Que Lathander mande essa criatura de volta para os nove infernos! – lançando um poderoso raio contra a criatura.
Ela mostrou ter uma grande destreza e infelizmente desviou do raio que atingiu uma parede próxima, provocando uma enorme rachadura. Se tivesse acertado a criatura ela teria sido seriamente ferida! Donovan parecia ter um plano pois tirou uma flauta dourada cercada de símbolos arcano que, ao tocar, o cercou por brilhantes notas musicais que voaram em direção ao verme alado. As notas pareceram entrar na cabeça da criatura, que parecia resistir aos efeitos, todavia, sua vontade não foi forte o suficiente para resistir ao poder ilusório do bardo e,de forma abrupta, nos olhou com ar de pânico, emitiu um urro de desespero e começou a se contorcer fazendo barulhos perturbadores, em seguida recuando na escuridão do abismo.
– Jojo! Rápido vamos nos apressar, parece que esta ponte não resistirá muito tempo, passemos um de cada vez para não derrubarmos a ponte – gritou o bardo.
– Mas já estamos na ponte todos de uma vez até o Goiki que pesa mais de 100 quilos está na ponte!
– Desculpe, estava focado com as minhas músicas e não percebi que todos vocês já tinham avançado.
Jojo andou até a metade da ponte e as cordas se romperam. No momento da queda, finquei meu machado na madeira para não cair no abismo, por sorte não estava podre o suficiente para se quebrar. Mas Jojo fez uma aposta errada, ao tentar se firmar em uma das madeiras da ponte esta se desfez como areia em suas mãos, ele começou a cair. Tentou se segurar na corda, mas sua mãe escorregou. Parecia que meu amigo iria se perder na escuridão do abismo, mas no último metro de corda rompida ele se segurou. Já o clérigo caiu do lado inicial da ponte, tentou se firmar nas cordas, sem sucesso, mas rapidamente Donovan o conseguiu segurar, impedindo a morte iminente de Ryu.
Estávamos separados. Eu e o guerreiro pendurados do lado oposto ao que estavam o clérigo e o bardo.
Sentimos que a corda começava a se romper nas pontas, eu e o guerreiro começamos a escalar, não poderíamos ir muito rápido pois isso romperia da corda, tínhamos que ir devagar. Donovan se preparou para lançar a magia de queda suave caso não conseguíssemos. Mas, graças a Bahamut, alcançamos o topo da ponte partida. Ao terminar a escalada, percebi uma voz falando diretamente na minha mente:
– Ora, ora, o que temos aqui, carne fresca.
Os sons de algo se rastejando se tornaram maiores do lado onde estavam o clérigo e o bardo. Uma massa arredondada de carne pútrida surgiu a frente deles, o monstro possuía tentáculos cujas extremidades terminavam em olhos horripilantes por todo o seu corpo arredondado, de sua mandíbula, uma língua monstruosa se arrastava pelo chão liberando uma ácido que corroía o chão por onde ele passava . Parecia se tratar de um Espectador, mas era menor do que minha avó me falava em suas histórias na tribo. Parecia se tratar de uma espécie menos ameaçadora, o que não me deixava menos preocupado com a situação de nossos colegas. O monstro falava diretamente em nossas mentes, sua voz parecia cansada, ele falava pausadamente, suas palavras pareciam embebidas de uma sede vil.
– Vejo que estão em uma situação complicada não? – ele fitou o clérigo e continuou. – Servo dos deuses… sinto algo… diferente em você, parece que… tem algo… diferente dos outros humanos que… eu já devorei… se quiser, posso ajudá-lo a sair… dessa situação.
O clérigo continuou a subir no outro lado, pareceu ignorar ou não se intimidar com o olhar ameaçador da criatura.
– Bom!… você me parece ser… especial… eu posso mostrar… misericórdia se… você conseguir… algo para… mim.
– O que seria? – perguntou Ryu quando ele e o bardo alcançaram o chão do outro lado.
– O coração… de uma certa… criatura… vejo que vocês conseguiram… subjugar… diversos desafios… devem ser… de certa utilidade… posso poupar você e seus amigos… mas não se preocupem… essa criatura… cujo coração interessa… ainda é… jovem e… inexperiente.
No lado onde eu e o guerreiro estávamos, vimos uma passagem para uma escadaria ascendente. Enquanto eu e Jojo pensávamos em uma forma de retornar para onde estavam nossos companheiros, escutamos passos lentos que se aproximavam de onde estávamos.
– Alguma coisa está vindo daqui – gritou Jojo
– Averiguem o lado de vocês! – gritou Donovan. – Talvez existam outras ameaças à frente! Acredito que eu e Ryu podemos nos virar com esse espectador.
Porém o monstro pareceu se ofender com Donavan e perguntou:
– O que quis… dizer… com isso?
– Só gostaria de conversar como seres civilizados.
– Você não… está em um ambiente… propício para esse tipo de… formalidades… mas sou bem… tolerante e de certa forma… admiro vítimas como você… que sabem se expressar… então… clérigo… você não… respondeu… se aceita o meu… acordo… talvez os seus amigos do outro lado estejam… em apuros… afinal nem tudo precisa ser… decidido com… força bruta… não acha?
Quando a criatura diz isso em nossas mentes, quase como uma maldição, duas múmias surgem das escadarias próximo a nós, então eu e Jojo ficamos de prontidão para derrotá-las!
Uma delas veio na minha direção fazendo um ataque de garras que rasgou minha carne e um líquido negro jorrou de um dos ferimentos expostos no antebraço enfaixado da criatura. O líquido atingiu minha pele e senti novamente os efeitos da maldição, meus músculos começaram a atrofiar um pouco mais, sinto um frio na minha espinha, um gosto amargo na boca, minha respiração fica pesada e por último eu sinto uma fisgada no meu coração que rouba parte de minha vitalidade mais uma vez. Do outro lado, o espectador vê a cena:
– Parece que… o bárbaro está em… maus lençóis, porém.. talvez uma das minhas… vítimas tenha a… solução para o seu… aliado, o que acha? Se aceitar o meu…acordo.. posso entregar um… pergaminho… que possa ser do seu… interesse.
Eu consigo ver os olhos da morte através do terrível semblante da criatura que me atacava, Jojo reagiu para desferir um golpe frontal na múmia, foi poderoso e provocou um grande ferimento na criatura. O líquido negro que jorrou da criatura tentou atingir meu amigo guerreiro, mas ele conseguiu desviar da maldição. Porém o morto vivo permaneceu firme e a nos atacar, a situação estava preocupante, do outro lado o espectador continuava com suas propostas duvidosas.
– Então… servo dos deuses… prefere perder o seu… companheiro ou vai aceitar… o meu trato?
Ryu parecia resiste a fazer um acordo com uma criatura vil, então começou a recitar preces divinas, porém o espectador lançou um raio com um dos seus tentáculos-olhos na direção do meu companheiro, impossibilitando-o de falar. Percebendo que nosso clérigo não estava disposto a negociar, a criatura se irritou:
– Clérigo insensato!! Não percebe… a situação… desfavorável… em que se… encontra!!! É bom… não tentar esses… artifícios baratos comigo!!! Estou a mais… tempo nesse mundo… do que… vocês!!!
Naquela situação, parecia que Donovan tinha apenas uma única escolha racional e lógica.Aceitar a proposta do espectador. Estava só, provavelmente com a mente perto da exaustão, não descansamos suficiente para que ele memorizasse seus truques de bardo, sem falar que ele não era o melhor combatente, ele olhou para nosso amigo clérigo, pareceu ler nos olhos de Ryu sua indisposição para realizar qualquer acordo com a criatura. Algo pareceu acontecer na sua mente, pois sua postura mudou.
Usou o mesmo truque de outrora, a força fantasmagórica da sua flauta em direção ao espectador, a música emanou mais uma vez e buscou atingir a mente da criatura. Infelizmente, o espectador mostrou-se mais sagaz que o verme alado, todos os olhos da criatura brilharam de forma amedrontadora, a luz emanada pela música do bardo começou a mudar de cor, tornou-se uma fumaça enegrecida que se voltou contra o bardo atacando a sua consciência. O espectador sorriu de forma sarcástica, mostrando seus dentes afiados em seguida. De forma abrupta, o bardo lançou suas mãos a cabeça e começou a clamar de forma desesperada:
– PARE!!! PARE COM ISSO!!!
– Qual será o seu maior… medo… bardo? Apostou errado em…me atacar… sofrerá as…consequências de seu… ato irresponsável… vejo que você é um romântico… incorrigível… que tal… eu proporcionar algumas… cenas que… confortem o seu… coração?
Donovan se vê em meio de neblina, envolto por espectros de luz que mostram suas memórias aleatórias, ao longe percebe um espelho onde os pensamentos se condensam. Ao se aproximar, o bardo consegue ver Selûne, a harpista que conhecera em Águas Profundas, sentada em um grande salão da Aliança dos Nobres, uma grande sessão de retórica ocorre naquele lugar, ela parece entediada. Está vestindo um manto de linho da região dos vales… Uma nova imagem aparece no espelho… Morgana, a filha da cozinheira da casa dos Ossington do vale que leva o mesmo nome, ela está numa cozinha com vários objetos de metal ao fundo, na sua mão esquerda ela segura uma grande colher feita de madeira, parece satisfeita ao fazer em seu caldeirão um doce de abóbora, na janela da cozinha é possível ver os sinais do fim do Alto Sol…
A imagem muda novamente… agora se via Luna, a vampira que os ajudou nas Ilhas da Lua quando raptados, ela está boiando em alto mar, ao longe é possível ver um farol, será que se tratava do farol do forte de Beluarian que fica no continente de Chult?! Como seu corpo poderia boiar para tão longínquas terras?… A imagem muda novamente… agora é possível ver a elfa que ajudaram a se libertar dos orcs escravagistas momentos antes, Ivellios Sianodel está acompanhando-a…
– Quem você prefere… perder… bardo?
Donovan fica perplexo com a abrangência do poder do espectador, sua boca fica seca, suas mãos tremem, sua cabeça dói. Como escolher alguém para morrer? Selûne sua paixão no mundo dos castelos e da nobreza, ele admirava a sua beleza moldada pela própria Sune; Morgana um amor simples e sereno, compreensiva e leal; Luna, enigmática, cuja beleza enaltece mistérios de uma noite esplendorosa, olhos brilhantes e cabelos prateados refletindo a luz das estrelas, seu semblante uma mistura de docilidade e imponência; a elfa um espírito livre, rebelde, provavelmente da família de Ivellios… Em um pensamento equivocado ele responde:
– Luna…
– Que vergonha bardo… pensei que… se tratava de um… herói e não um… rato deplorável… escolher quem deve…viver ou…morrer… punirei sua decisão ceifando a vida de… TODAS!!! HAHAHAHAH!!!
As visões retornam…
Selûne está no alto de um castelo observando o pôr-do-sol, uma das empregadas do castelo aproxima-se pelas costas e enfia uma adaga com o símbolo dos Zhentarim em suas costas, derrubando-a na direção das pedras que cercam o castelo…
Morgana está na porta de sua casa olhando a estrada quanto vê uma nuvem negra que cerca a casa materializando-se como um espírito ceifeiro de almas que lhe rouba a alma, uma árvore próxima chora, fazendo cair a primeira folha de outono…
Luna parece estar recobrando a consciência quando é surpreendida com enormes tentáculos que a tragam para as profundezas do oceano, as bolhas de seu último fôlego se misturam a uma mancha vermelha no oceano…
Por fim, Donovan vê com grande pesar a elfa sorrindo e correndo pelas árvores, parece um momento de descontração com Ivellios, quando ela pensa ter despistado o ranger, ele surge em sua frente, seu semblante parece frio e repleto de desprezo. De forma cruel ele lança uma flecha no coração da elfa fenecendo lentamente…
Donovan caiu no chão grunhindo, lágrimas não paravam de cair, uma mistura de tristeza e raiva percorria seu semblante, apertava sua flauta com tanta força que sangue saia de seus punhos… sua mente parecia ter sido vencida pelo espectador.
Do outro lado do abismo, me vejo frente a frente com a múmia, sua maldição causa necroses por todo o meu corpo, porém isso não me abala! Sou um Bárbaro! Filho de Goiki II! Grande guerreiro das tribos de Chult!! Ruína de grandes Feras!! O sangue de meu pai é muito mais forte do que esta maldição que tenta me sucumbir!!!
Utilizando as forças que ainda me restam, eu entro em fúria segurando o meu poderoso machado e desfiro três ataques: o primeiro acerta diretamente no diafragma da criatura, o segundo acerta suas pernas, fazendo-o ajoelhar, e o terceiro… divide a criatura ao meio. Ainda existia outra múmia para derrotar. Ela me lançou um olhar perturbador, porém meu estado irracional me torna forte suficiente para não me abalar contra seus truques.
Jojo como um guerreiro extremamente preparado, também não se abala perante a abominação. A múmia ao ver que não somos abalados grita de raiva e vem em minha direção, sinto suas garras em minhas entranhas. Seu pós amaldiçoados jorra do corpo decomposto, mas dessa vez consigo me desvencilhar.
Do outro lado, o Espectador continua sua oferta de clemência para Donovan que está caído, sem esperanças. Jojo grita em sua direção:
– Não desanime meu amigo! Aceite a proposta!!! Nem tudo está perdido!! Precisamos de você meu amigo!! Erga-se!!!
Donovan nos ajudou tantas vezes que não me surpreendo com a fala de nosso amigo guerreiro, parecia que as palavras do bardo em batalhas anteriores fizeram nascer nele uma inspiração repentina. O bardo, nada podendo naquela situação de mente estraçalhada, não vislumbra outra alternativa que não seja a de concordar com o Espectador:
– Tudo bem! Farei tudo que você quiser, só não me mostre mais essas imagens repugnantes!
O Espectador mantém um sorriso no rosto, com um olhar sádico ele move seus tentáculos dentro de sua massa pútrida e retira algo de seu interior, um líquido verde com odor de enxofre pinga do seu corpo e, como um sangramento, ele expele uma caixa de madeira em direção ao bardo. Havia um símbolo na tampa bem apagado, não dava para reconhecer a origem e Donovan cuidadosamente abre a caixa revelando o seu conteúdo: um pergaminho antigo em élfico contendo a magia de remover maldição e uma gema marrom, o Espectador ri da inferioridade do pobre bardo jogado no chão.
– Vocês precisarão… decifrar o… enigma para poder adentrar… na sala onde… se encontra a criatura… o dragão branco, esta gema… corresponde a uma… parte da solução do… enigma, você precisará de outras… três… chaves que estão no… subterrâneo da… pirâmide. Lembre-se… bardo… temos um… acordo…traga-me o… coração do dragão branco… que habita as profundezas da… pirâmide de gelo…afinal você me parece… representar bem o seu… grupo… dê-me sua palavra que… trarão… coração para… mim.
Donovan levantou enxugando suas lágrimas e guardando o pergaminho, fitou diretamente o monstro antes de falar.
– Eu sou do tipo que cumpre suas promessas, ainda que sejam promessas feitas com tão biltres criaturas.
A criatura esboça um sorriso e direciona seus tentáculos para a ponte rompida, ele une novamente as cordas, permitindo a passagem para o outro lado do abismo e começa a se arrastar para escuridão. Antes de desaparecer totalmente ele diz.
– Estarei esperando… ansiosamente pelo… coração… bardo.
No nosso lado, a múmia remanescente utiliza-se de truques profanos. Jojo usa suas técnicas de combate para desferir golpes precisos no monstro, porém, as forças nefastas que a dominam se mostram resistentes. Utilizando meu poder primitivo desfiro uma tempestade de golpes aniquilando-o definitivamente. Porém, nesse mesmo momento, senti os efeitos da maldição, minha pele começou a morrer, partes das minhas escamas soltam-se de meu corpo, antes de minha visão escurecer, vejo espíritos caídos se aproximando, na minha boca sinto o gosto da morte mais uma vez, vou ao chão…nas minhas entranhas sinto como se vermes me devorassem. Será que o manto da morte e o frio da Eternidade Gélida de Geena estavam me chamando? Sinto uma forte luz se aproximando…
Ryu vinha em minha direção do meio da ponte empunhava o pergaminho que Donavan ganhara, começou a falar palavras em celestial:
– Archangelus et justitiam in nihilum redigere demones mortuis!!
Do teto veio uma luz celestial, tomou a forma de um anjo segurando um arco e lançando sete flechas flamejantes que acertam os demônios a minha volta, o calor das chamas reacenderam minha vontade de viver, meu coração se encheu de altivez, as feridas estancaram, minha pele é renovada!!
Me levantei respirando com alívio quando Donavan e Ryu nos alcançaram. Olho para nosso amigo clérigo e agradeço pelas bênçãos que renovaram meu ser. Donavan parecia estar amaldiçoado e abalado com os efeitos do Espectador, infelizmente Ryu utilizou do pergaminho em mim, Donavan tentava parecer forte me olhando confiantemente e disfarçando sua clara insegurança com um sorriso em seu rosto.
– Então, vamos prosseguir?! As pessoas da cidade necessitam da nossa ajuda!
Assim seguimos, subindo as escadas por onde as múmias vieram. Andamos um pouco até uma passagem próxima onde o caminho se separava em outros três, um deles parecia subir para superfície o outro era uma descida, o do meio parecia seguir reto sem alterações de nível.
Jojo utilizou seus conhecimentos de rastreio para decidir o caminho. Pelas pegadas recentes dos humanóides, definiu que o caminho mais seguro seria o do meio, então fomos sendo guiados pelo guerreiro. Andando mais um pouco e nos deparamos com outra bifurcação, escolhemos um dos caminhos e chegamos até um corredor, no final dele existia uma pequena grade com aproximadamente um palmo de largura. Pela abertura, conseguiamos ver do outro lado vários humanóides acorrentados, consigo perceber que a maioria são anões, mas também indivíduos de outras raças. Tentei com golpes na parede libertar os escravos, entretanto, a parede era densa e o barulho poderia alertar os inimigos. Uma elfa aproximou-se da grade e sussurrou:
– Cuidado! vocês estão fazendo muito barulho! Vão chamar a atenção do clérigo!
– Mas onde estaria esse maldito clérigo? – perguntou Jojo.
– Ele está por aí, esse caminho a direita deve leva a seus aposentos, depois de muitas luas, pude perceber que ele anda muito nessa direção.
Um humano mais velho também se aproximou vestindo trapos e para Donavan disse.
– Tomem cuidado ele, ele possui feras aladas e espíritos malignos ao seu comando.
– Eu acredito que o verme que encontramos antes fosse uma dessas criaturas então. Obrigado, vamos tentar derrotá-lo e depois encontraremos uma maneira de libertar vocês.
O velho agradeceu e continuou:
– Espero que vocês saiam vitoriosos! Por favor, levem isso com vocês – esticou a mão pela grade e nos entregou uma gema azul – Essa gema consegui de um verme algum tempo atrás, pode ser útil na jornada. Eu sou um mercenário das terras dos vales, me chamo Joshua.
Donavan agradeceu ao homem prometendo retornar em breve para ajudá-lo. Então precisávamos decidir qual caminho seguir e, observando as pegadas, fomos pela direita. Caminhamos mais um pouco até uma sala ampla e arredondada, no final deste recinto outro caminho que seguia. Porém este grande salão também tinha outros mistérios.
Uma grande caveira flutuava no centro e todo local envolvido por diversos sarcófagos erigidos e, aparentemente, presos nas paredes. Estávamos todos na entrada quando Donovan toma a iniciativa e entrou na sala seguindo para onde estava a caveira.
O bardo então tirou a escultura da caveira de ouro que conseguimos com bandidos em lutas anteriores, esperávamos alguma reação daquela que flutuava. Ao perceber que nada aconteceu, ele continuou seu caminho em direção a saída e, nesse instante, a caveira flutuante rompeu em fogo esverdeado e despertou de seu aparente “sono”.
– Quem é você?? Intruso!!!!!
Donavan de forma muito ardilosa disse:
– Sou seu mestre! Não me reconheceu biltre serviçal!!!!
A criatura se aproximou de Donovan que mantinha um olhar ameaçador para ela. Fiquei na iminência de atacar a caveira, mas fui interrompido por Jojo que sinalizava para esperar.
Após observar Donovan por alguns segundos, o fogo esverdeado diminuiu.
– O senhor está diferente mestre. Perdoe-me. Seus disfarces estão cada dia melhores, confesso que este é muito melhor do que aquele de clérigo anão. O plano está indo como o senhor ordenou, o contrato com o culto do dragão foi firmado, estamos a cada dia mais próximos da volta de Tiamat e de Vecna hihihihi.
Donavan deu um sorriso de canto de boca e disse:
– Excelente!!! Então eu vou à sala ao lado e… aqueles na porta são meus novos lacaios!
Nesse momento fomos entrando no salão, não entendi muito bem o que acontecia, mas esperei a iniciativa de Jojo para tomar alguma decisão. Quando atravessamos a metade do salão, sentimos as chamas da caveira aumentarem.
– Mestre!!! O que um servo de Lathander faz com você??!!! Ele não concorda com os nossos planos, afinal Lathander e um deus bondoso!!!
Donavan tenta manter sua atuação dizendo:
– Você adiantou os meus planos lacaio!!! – disse Donovan mantendo o ato – Rápido!! Vocês dois segurem o clérigo!! Ele será um sacrifício extra para Vecna e…
Antes que pudesse dizer algo mais, o bardo foi interrompido pela caveira:
– AHHH!!! Então eu mesmo farei isso mestre!!!!
O fogo da caveira subiu rapidamente iluminando toda a sala, foi possível ver nossas sombras projetadas em direção aos sarcófagos, a sombra de Ryu começou a ganhar vida, erguendo-se do chão e adentrando um dos caixões. Nosso amigo clérigo ficou pálido, seus olhos começaram a se perder e na iminência de desmaiar, sua fé em Lathander e seu sangue celestial o salvaram, pois um rompante de luz na forma de grandes asas surgiu nas costas do clérigo impedindo-o de morrer naquele ritual profano.
Donovan se virou para a caveira com ar de reprovação.
– Agora enxerga?! Lacaio estúpido! Por isso que eu mesmo faria o ritual em meus aposentos, o sangue deste clérigo é muito poderoso para um ser insignificante como você!!!
– Sim mestre… perdoe-me por não ter tomado a vida deste mortal, mas… hehe…nem tudo foi perdido, veja…
Nos viramos para onde ela fitava e vimos a tampa de um dos sarcófagos se abrir e de dentro uma múmia semelhante a Ryu emergiu para nossa surpresa e preocupação…